quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Artigo do Diário do Professor

Mais um artigo-desabafo de um professor que ainda persiste neste país...





Dia do professor



Prezadas e prezados amigos,

Não acredito em "dias".

Dia do meio ambiente, dia da árvore, dia do caceteàquatro, dia do professor. Tem dia de tudo, de nada e de mais um pouco.

Dia do professor, pra mim, só serve para feriado.

Aproveitei e fui gastar umas milhas acumuladas no friozinho de Curitiba. Vejam as fotos no facebook da minha digníssima esposa.

Mas vale (mais) algumas reflexões.

Na 4ª anterior ao feriado houve uma apresentação da orquestra dos alunos de uma das minhas escolas. Um grande e ótimo projeto. Alguns antigos alunos meus estão hoje "na estrada", com perspectivas de ganhar a vida tocando violino, clarinete, flauta…

Um a um os professores foram chamados, recebendo – como homenagem e por incentivo da equipe de coordenação – um coro de aplausos e gritinhos.

Na minha vez, começou-se com aplausos, mas ganhei umas vaias vultosas.

Fiquei matutando de onde elas vieram. Não de quais alunos, mas de onde de mim.

Cheguei à conclusão de que sou hoje nem uma sombra do professor que fui. Fiquei também matutando a razão disso.

Não consigo ver a educação como "é assim mesmo", como "não tem jeito", nem como "vai tudo bem, fazemos o máximo que podemos".

Algo está errado e não consigo me enquadrar. Aliás, nunca consegui.

O tempo é curto; o curto tempo é mal distribuído; a verba é pouca; a pouca verba é mal empregada; há muitos professores ruins e nada acontece com eles; há muitos professores bons que não conseguem; a estrutura da escola é pífia; a pífia estrutura é mal aproveitada; os alunos que nada querem não deixam quem quer querer e nada acontece pra mudar isso; os alunos que querem são mal aproveitados; há muita distribuição e desperdício de material; por outro lado, há falta de material; os alunos ficam pouco na escola e muito na rua; os conteúdos são esquecidos; quando os conteúdos não são esquecidos, são absolutamente desimportantes…

Poderia falar uns 25 centímetros de minhas angústias, mas o fato é que é difícil, após 12 anos de magistério, não ver perspectivas de mudanças do que é, de fato, fundamental.

Nesta mesma semana soube que uns 4 ex-alunos foram assassinados, dentre Niterói e Rio, seja por bando rivais (de traficantes) ou pela polícia (o que dá na mesma…).

Mas a vida do aluno extra-escola praticamente não importa para os fazedores das políticas educacionais. Daí vem o quererem fazer formação, pagamento de 14ºsalário por desempenho, cobranças, projetos de reforço quase de mentirinha…

Ora, reforço do quê, no final do ano, se não se consegue a base? A casa não tem fundações, vai reforçar as paredes?

Continua-se achando que os professores são os culpados pela falência da educação. Mas eu vejo que somos vítimas, como os alunos. Mesmo os maus alunos, mesmo os péssimos professores.

O problema é anterior, é de base, é social.

A escola tem que atuar socialmente. Não como pura assistência social, mas abrangendo a vida toda do aluno. A escola tem que ser a família que eles não têm, o lazer que eles não têm, a segurança que eles não têm, o espaço de estudo que eles não têm, o reforço (de fato) que eles não têm, as atividades extra-curriculares que eles não têm…

E isso não se consegue com 3 ou 4 horas por dia, sem estrutura e com professores estressados desestimulados mal pagos trabalhando em diversos lugares.

Ao não ver – e não conseguir – mudanças, não consigo ficar imerso na mesmice.

Acho que é por isso que estou assim. E eles percebem.

Ou eu mudo o meio que me cerca, ou eu mudo o interior que me recheia.

Quem sabe os dois?

Declev Reynier Dib Ferreira
Professor, eu acho.

Fonte: Blog Diário do professor.

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